Nos últimos dias, a imprensa nacional tem dado destaque aos riscos estruturais causados pela Lei n. 15.077/2024, a qual, ao invés de promover o propalado ajuste fiscal, acaba por sacramentar a ampliação do Benefício de Prestação Continuada (BPC) a deficiências leves, incluindo quadros como o autismo grau 1, cada vez mais frequente.
Embora o Governo alegue promover maior inclusão social, a incorporação de novos beneficiários sem a devida análise de impacto compromete a solidez orçamentária do programa. A proposta deveria seguir o teor original e se concentrar em contemplar pessoas com incapacidades moderadas ou graves.
Os vetos apostos pelo Presidente da República já indicavam a necessidade de estudos técnicos aprofundados. Ainda assim, a flexibilização excessiva ampliou o cenário de expansão de gastos, cujos reflexos são visíveis nos relatórios fiscais do governo.
Há anos, a Subsecretaria da Perícia Médica Federal do Ministério da Economia produziu nota informativa na qual apontou a efetiva tendência de crescimento no número de concessões do BPC, que passaria a custar dezenas de bilhões de reais por ano, em um quadro de nítido agravamento do equilíbrio das contas públicas.
Já naquela época, os órgãos de controle – especialmente o Tribunal de Contas da União (TCU) – advertiam que a falta de avaliações técnicas rigorosas levava à inclusão indevida de beneficiários e abria espaço para o aumento exorbitante das fraudes, de modo que a expansão de gastos assistenciais sem balizas claras reclamaria cortes orçamentários futuros que penalizariam justamente quem mais precisa.
Por óbvio, a sustentabilidade dos gastos com o BPC passa necessariamente pela exigência da realização de avaliações periciais presenciais capazes de atestar, de modo confiável, o grau de comprometimento dos requerentes dessa espécie de benefício. A flexibilização desse mecanismo de segurança, iniciada com a Lei n. 14.724/2023 – que autorizou a utilização de instrumentos de telemedicina para a análise dos requerentes do BPC – causou incentivo ainda maior à formulação de requerimentos por aqueles que não possuem direito.
A falta de regulamentação para a avaliação biopsicossocial, prevista em lei, agrava o problema. Sem parâmetros claros, torna-se difusa a definição de quem se enquadra como pessoa com deficiência de gravidade compatível com os requisitos das normas que amparam o direito dos portadores de deficiência.
Inclusive, diante dessa lacuna regulamentar, setores do Governo e da sociedade continuam lutando para implementar parâmetros mais flexíveis de definição das deficiências, de sorte a permitir que um número cada vez maior de beneficiários e, consequentemente, um agravamento exponencial dos gastos com o BPC.
A redação final da Lei n. 15.077/2024 e os vetos presidenciais não deixam claro como diferenciar os graus de deficiência (leve, moderado e grave). Também não são definidas as diretrizes sobre a compatibilidade ou o retorno a outros programas sociais, como o Bolsa Família, o que sugere um planejamento governamental insuficiente.
Em vez de reforçar o controle e a consistência do sistema de concessão e de pagamento dos benefícios, as recentes alterações aprofundam a insegurança jurídica e geram maior preocupação entre os atores sociais e governamentais comprometidos com o ajuste das contas públicas.
No Brasil, o déficit fiscal associado à assistência social será cada vez pior se não houver a retomada de critérios claros e técnicos, além de fiscalização contínua e participação efetiva dos Peritos Médicos Federais no fluxo de concessão do BPC. A carência de regulamentação técnica e de rigor gerencial por parte do Governo Federal inviabiliza a eficiência do benefício em questão e prejudica quem mais precisa, pois, considerado o seu impacto no orçamento público geral, nota-se que esse desequilíbrio ameaça a saúde dos sistemas previdenciário e assistencial.
Em síntese, a inclusão indiscriminada de novas categorias de beneficiários, sem o reforço da atuação da Perícia Médica Federal e a promoção sistemática de estudos de impacto, representa um grave risco.
Embora se fale em expansão de direitos sociais, o resultado é a precarização do sistema e o aumento vertiginoso do número de fraudes e de concessões indevidas. Infelizmente, essa tem se tornado a marca registrada da atual gestão do Poder Executivo federal.
Se não forem adotadas medidas estruturantes, o desequilíbrio será cada vez mais acentuado. Com isso, a essência do amparo social será comprometida, e os mais vulneráveis continuarão a ser os principais prejudicados.
Enquanto a Perícia Médica Federal não receber o devido destaque e valorização, as políticas previdenciárias e assistenciais não terão a sustentabilidade necessária para permitir o correto desenvolvimento do país.
Diretoria da ANMP